sexta-feira, 9 de maio de 2008

Crônicas




Mais uma crônica lida no programa de rádio que apresentei há alguns anos.
Minha Opinião - Novembro 2002

Esmolas oficiais

Fim de governo, começo de governo. Transição, programas concordantes e excludentes. A grande discussão do momento é como ajudar as milhares de famílias de desassistidos pelo Brasil afora. Cupons, cartões eletrônicos, tíquetes, cestas básicas e outros projetos de esmolas oficiais são trabalhados para serem colocados em prática e alimentar brasileiros que só vivem mesmo nos números das estatísticas do IBGE. Só tem nome para compor as listas de auxílio das prefeituras e ou ministérios. O Brasil passa fome, desabrigo e desemprego. Famílias inteiras sobrevivem - o termo é esse - com mais alegria quando recebem quinze reais por mês, por ter um filho na escola. Quinze reais por mês. Tecnicamente isso dá cinquenta centavos por dia; três ou quatro pães. Secos, sem manteiga.
O que precisará acontecer para que a sociedade perceba que deixar as coisas do jeito que estão é só ficar esperando pelo caos que não deverá demorar a chegar?
Nossos famélicos ainda têm sorte e comem pelo menos uma vez por dia. Aparecem em fotos e reportagens de TV vestidos, corados e até gordinhos se comparados as já esquecidas vítimas da fome na África. Lembram de Biafra? Até hoje morrem pessoas por lá. De fome. Pois é, nossos irmãos brasileiros têm mais sorte. O governo pode ainda dispor de um bolo para distribuir partes, cada vez menores. A solução não pode ser dita aqui, agora por mim. Ela deve vir do conjunto social. Mas deve vir mesmo. Ficar mudando nomes das esmolas oficiais e a forma como elas são dadas, não trará muita ajuda.
Colocar, por exemplo, nas costas de uma criança de sete ou oito anos a responsabilidade dela estar na escola para a família poder receber míseros quinze reais é desumano. É querer encobrir o fato social com teoria econômica. Todo mundo sabe que na hora do “pega pra capar”, os adultos vão cobrar da criança, não o aprendizado, mas a sua continuidade na escola. Assim como os donos dos meninos de rua cobram os rendimentos no final do dia. Vendendo ou roubando, eles têm que dar conta de um determinado valor, senão o pau come. É preciso arranjar programas para trazer atividades para os adultos, para que eles saiam de suas casas e produzam em vez de ficarem esperando seus filhos voltarem da escola. Se a população trabalha e produz, dispensa ajuda oficial, cria riquezas para o país que aumenta o bolo, que não precisará ser dividido tantas vezes para se transformar em esmola.
Se não acabarmos com essa política de assistencialismo e a crença que é só assim que se vive, teremos muito poucas chances de sobreviver como sociedade, até porque ninguém vai nos dar esmolas...


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