terça-feira, 4 de março de 2008

Crônicas

Revendo alguns papéis (e isso eu tenho um bocado) achei uma pasta cheia de crônicas escritas para serem lidas num programa de rádio que apresentei há alguns anos.
Como sempre me pautei somente pelo meu pensamento e pela minha estranha forma de ver o mundo, vez por outra os ouvintes chiavam por não concordarem com a minha opinião, que era o nome do quadro onde eu lia a crônica. Agora que estou aqui no blog, resolvi então colocar à disposição dos internautas algumas dessas crônicas. Sem ordem cronológica, nem com referências a época ou situação.
Aqui vai a primeira.




Minha Opinião Agosto 2002
Espermatozóides
Mulheres que querem engravidar e não conseguem porque seus parceiros são inférteis, ou porque não tem companheiros, vão a procura de clínicas especializadas em fertilização in vitro para poderem gerar o tão esperado filho. O material masculino vem de doadores. Pois é, além, de sangue e leite, também se doa sêmen. E assim como sangue e leite, o sêmen também está faltando no mercado. O material já está sendo importado dos Estados Unidos para poder satisfazer os desejos maternos das brasileiras. Procedimento relativamente recente nos meios científicos, este novo método de produção de bebês é só mais uma pequena parte da grande discussão sobre os desígnios naturais da humanidade e da própria ética humana. Critérios colocados indicam que o doador não pode ser homossexual. A receptora pode. O doador deve ser jovem, a receptora já pode ser madura. Coisas da nossa sociedade. É claro que existem motivos para isso, mas causam estranheza certas distinções. A grande discussão contém também itens como direitos dos filhos gerados para com o doador. Tem ou não tem vínculo legal o filho ou a filha? O que as leis preconizam? E os doadores têm ou não tem o direito de conhecerem os seus filhos de doação? O egoísmo e a mesquinhez humanos sobressaem-se nesta hora. Os adultos têm o direito de gerar filhos nessas condições? Os seres humanos são os únicos a terem consciência de sua existência e, por isso, são sabedores ou interessados em sua história. Vinculam-se por toda a vida com pais, mães, seus criadores. O lado emocional é muito forte e pode caracterizar toda um vida, seja pelo lado positivo, seja pelo negativo. Assim como nos filhos adotados, essas relações são potencialmente explosivas, caso os adultos, agentes da criação, resolvam esconder da criança a sua verdadeira origem e passem a viver numa eterna mentira e o que é pior, numa eterna angústia com medo que a verdade venha à tona. Nada de mais contra as origens dos adotados, o pior problema é saber que se foi enganado por aqueles em que ele tinha a maior confiança. Mas na fertilização in vitro é diferente porque a criança não existe, será gerada. O homem vai aos poucos mexendo em um caldeirão sem autorização e sem conhecimento. Assim como o aprendiz de feiticeiro, depois de feita a besteira, vai demorar a se restabelecer a ordem natural das coisas que talvez nem venha a ser originalmente conhecida. Porque a necessidade de gerar vida? Com tantas outras precisando ser cuidadas por terem sido abandonadas ou por estarem sendo maltratadas por pessoas que geraram filhos assim como os animais fazem. Por fazer. Será que um dia nos daremos conta que não podemos oferecer um mundo digno aos nossos filhos se não cuidarmos dos filhos, que soltos, vagam pelo mundo de hoje? Precisamos ver um pouco mais longe que nossos umbigos. Precisamos perceber que viver e melhorar a nossa vida não é sair por aí botando filho no mundo.

Um comentário:

Sahmany - Sandra Mara disse...

Esse negócio de adoção mexe muito comigo, Carlos. Nem vou opinar, até pq, se eu o fizer, tem gente que vai me chamar de doida.
Só posso te dizer o seguinte: eu fui adotada e, sinceramente acho, que seria melhor se não tivesse sido.
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Outra coisa, tu tb fez rádio?
Fui locutora de FM por muitos anos.
E acho que por causa disso sou bem melhor falando que escrevendo. Tem gente que consegue se sair bem nas duas maneiras de se expressar. Eu já não consigo. Tenho imensa dificuldade de colocar no papel o que penso, ou quero falar. É complicado demais pra mim.
Abraço.